Na liturgia deste domingo, ao nos ensinar que,
apesar das tribulações, a prática do amor deve ser vivida em sua radicalidade,
Jesus mostra que era necessário que o amor de Deus fosse manifestado até as
últimas consequências. Motivados pela Palavra de Deus, cujo mês celebramos,
sigamos seus passos, oferecendo também o que temos e somos em favor dos irmão
22º DOMINGO DO TEMPO COMUM – 3 de setembro
“Vosso amor vale mais do que a vida”
(Sl 62,4)
Por Aíla L. Pinheiro de
Andrade, nj
Introdução geral
O Filho do homem está
disposto a morrer não porque o sofrimento agrada a Deus, mas por amor à vida
que é de todos. O sofrimento somente tem sentido quando é fecundo, quando é
consequência de uma luta em prol do bem e contra o mal, pois é assim que o
sofrer de um traz vida plena a outros. Um sofrimento que é compaixão pelos que
sofrem, que é solidariedade com as vítimas do egoísmo e do pecado. É nisso que
se traduz a entrega na cruz.
Cristo anuncia aos
discípulos que vai dar a própria vida e o fará para que todos possam ter a vida
em plenitude. Os seguidores de Jesus têm, portanto, que estar dispostos a
iniciar um caminho de entrega generosa da vida, a exemplo de seu Mestre.
II – Comentários aos textos bíblicos
Evangelho (Mt 16,21-27):
“Renuncie a si mesmo” (Mt 16,24)
Jesus irá a Jerusalém para
doar a própria vida, não para conquistá-la pelas armas nem para reinar em lugar
do imperador romano, como pensavam os discípulos.
Em Jerusalém, os líderes
religiosos da época consideravam Jesus perigoso e, em nome da lei e dos
costumes, perseguiram-no até a morte. Jesus andará na contramão desses líderes
religiosos, não revidará violência com violência; sua luta de combate ao mal
será uma luta pacífica, pois usará a arma do amor.
Jesus não veio impor seu
projeto pela força nem usar em seu favor as armas da violência e da guerra.
Jesus não quer morrer na cruz, mas tem de estar disposto a morrer na cruz – é
isso que deseja fazer os discípulos entender. Jesus sabe e declara aos
discípulos, no momento central de sua vida, que será crucificado em Jerusalém.
Ele mostra que aceita as consequências daquilo que praticou e ensinou. Está
consciente do perigo pelo qual passa e não quer que os discípulos considerem
sua morte uma fatalidade, um acidente inesperado, mas consequência do seu modo
de viver.
Contudo, Pedro tenta
corrigir Jesus a partir de sua própria noção de messianismo triunfante. Mas
Jesus também corrige Pedro: se Deus está conosco, não significa que iremos nos
dar bem em tudo que fizermos, mas, se Deus está conosco, temos de estar
dispostos a dar a nossa vida pela causa de Deus. Pois somente quando superamos
o egoísmo e o desejo de domínio e de violência, em atitude de entrega e
abandono a Deus, pode acontecer a mais perfeita comunhão entre os seres
humanos. Isto é o reino de Deus, este é o desígnio que Deus tem para nós.
As palavras de Jesus
expressam o paradoxo fundamental da vida cristã: num mundo dominado pela lei da
imposição de vontades dos violentos, aqueles que pretendem seguir Jesus devem
servir os demais em total gratuidade, a ponto de estar dispostos a morrer por
eles.
I leitura (Jr 20,7-9):
“Seduziste-me, Senhor!” (Jr 20,7)
Na primeira leitura, o
profeta Jeremias, que havia chamado o povo à conversão, a um retorno para Deus,
não teve sucesso em sua empreitada. O povo em geral e principalmente os líderes
políticos e religiosos não acolheram a palavra de Deus proclamada por Jeremias.
O profeta viu amigos,
familiares e conhecidos voltarem-lhe as costas e recebeu o desprezo, a maledicência,
os insultos e as zombarias de seus adversários.
Jeremias conheceu o
abandono e a solidão como consequência de sua fidelidade a Deus e à sua missão.
Então, desiludido, o profeta resolveu parar de exercer a profecia. Mas naquele
momento que decidiu parar de proclamar a palavra de Deus, Jeremias descobriu o
quanto estava apaixonado pelo Senhor. O amor por Deus e por sua palavra era
como um fogo no coração do profeta. Foi esse amor por Deus que o impulsionou a
seguir em frente e a assumir todas as consequências de sua missão. A atitude
de Jeremias, de estar disposto a entregar a própria vida por amor a Deus,
ilumina a palavra de Jesus aos discípulos quando afirmou ser necessário tomar a
cruz a cada dia e o seguir.
II leitura (Rm 12,1-2): Oferecei-vos em
sacrifício
Nessa leitura, Paulo nos
esclarece a respeito de como deve viver aquele que se sente chamado à salvação.
A adesão a Cristo e a acolhida da salvação não significam aderir a verdades
teóricas e abstratas, mas exigem um caráter prático, um comportamento coerente
com a vida do Mestre a quem seguimos.
Ser cristão não significa
ganhar muito dinheiro, ter saúde, um bom casamento e ver tudo ir bem na vida.
Ser cristão é oferecer inteiramente a vida a Deus, para a vida e para a morte
que ele decidir. A oferta da própria vida no abandono nas mãos de Deus e no
serviço ao próximo é o que Paulo chama de “hóstia viva”; em outras palavras,
“sacrifício vivo, santo e agradável a Deus”. O verdadeiro culto, a perfeita
adoração, a autêntica liturgia é a entrega da totalidade da vida do ser humano
a Deus no serviço ao próximo.
III. Pistas para reflexão
Pedro nos representa. Ele
está disposto a seguir Jesus, a ser caridoso com os pobres, a ser compreensível
com os pecadores, enfim, não quer fazer nem ver ninguém sofrer. Mas Pedro não
quer aceitar a cruz por amor à causa de Jesus e do reino de Deus. Quer ser um
cristão vencedor, quer que tudo dê certo na vida, sem sofrimento nenhum.
Jesus, o profeta Jeremias
e o apóstolo Paulo sabem que não é possível fazer a vontade de Deus e não
sofrer animosidades por causa do Reino proclamado e testemunhado. Eles sabem
que somente se pode ajudar aos que sofrem quando se está disposto a morrer com
eles e por eles, em Jerusalém e em Roma, no passado, ou em qualquer tempo e
lugar, até que Cristo venha.
Aíla L. Pinheiro de
Andrade, nj – graduada em Filosofia e em Teologia. Cursou mestrado e doutorado
em Teologia Bíblica pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia, FAJE (MG).
Atualmente, leciona na pós-graduação em Teologia na Universidade Católica de
Pernambuco, UNICAP. É autora do livro Eis que faço novas todas as coisas –
teologia apocalíptica (Paulinas). E-mail:aylanj@gmail.com
LEITURAS DA SEMANA
04/2a FEIRA: 1Ts 4,
13-18; Sl 95(96); Lc 4, 16-30;
05/3a FEIRA: 1Ts 5,
1-6.9-11; Sl 26(27); Lc 4, 31-37;
06/4a FEIRA: Cl 1,
1-8; Sl 51(52); Lc 4, 38-44;
07/5a FEIRA: Cl 1,
9-14; Sl 97(98); Lc 5, 1-11;
08/6a FEIRA:
Natividade de Nossa Senhora, festa: Mq 5, 1-4a ou Rm 8, 28-30; Sl 70(71); Mt 1,
1-16.18-23 ou mais breve 1, 18-23;
09/SÁBADO:
S. Pedro Claver Presb: Cl 1, 21-23; Sl 53(54); Lc 6, 1-5