segunda-feira, 13 de novembro de 2017

Boa Vista numa Semana Amazônica

Depois da Semana Amazônica na PUC – RJ e a pesquisa no Museu do Índio em vista de fazer um laudo antropológico a respeito da Terra Indígena Uirapuru dos Parecis, vim para Boa Vista (Roraima). Chegando na cidade no dia 06 de novembro de 2017, o que impacta são os venezuelanos com placas nas ruas pedindo trabalho, comida, vida digna... Nos sinais procuram um trocado quando limpam os parabrisas, um símbolo da inutilidade do ser humano. O Irmão Medino (Felician Andre Abrahan) veio da Guiana para me receber em Boa Vista (Roraima) e juntos visitamos algumas comunidades Wapichana e Macuxi que estão dentro das paróquias de Bom Fim (RR) com cerca de 12 mil habitantes e de Lethen (Guiana), atendidas pelos jesuítas. Com sabedoria, quando perguntávamos se eram venezuelanos, guianeses ou brasileiros eles diziam que eram Wapichana ou Macuxi... . Os indígenas transfronteiriços possuem esta capacidade de intercâmbio e de diálogo, aprendendo as línguas, trocando produtos, comendo as comidas dos outros, vivendo lado a lado nas cidades... e que onde eles moravam era prejudicial
O Padre Urbano nos levou até sua casa em Novo Paraíso e de lá fomos para Pium. Valfredo Gomes chegou de noite para pedir óleo bento para auxiliar o pajé que viera da Guiana na cura de sua esposa Ivanete Pereira de Souza com os 7 filhos menores de idade. De manhã no dia seguinte seu Alfredo, o pai de Ivanete veio para confirmar a indicação de tratamento natural sugerido ontem à noite. Tomamos chimarrão e conversamos. Comunicou que Valfredo foi trabalhar e que o casal com os filhos estavam se mudando para a casa dele aqui no Novo Paraíso, pois aqui o ambiente é mais saudável.
“Seja bem vindo à casa de todos” na língua Wapixana.
    Com o Irmão Medino fomos traduzindo um texto do inglês para o português. Aos poucos fui compreendendo que o Padre Paul Martin enviou Medino para ficar comigo nestes dias de introdução ao mundo indígena na Guiana e não queria que eu atravessasse a fronteira antes dele ter organizado as mudanças que está fazendo com os novos jesuítas indianos que estão chegando também. Enquanto isso participamos da reunião da Pastoral Indigenista da diocese de Roraima. Encucou que não havia interesse pelos indígenas que estão vindo como refugiados da Venezuela, algo que também percebi em Manaus. Com Medino fomos ao abrigo Pintolândia conhecer e Nicholas da Fraternidade nos acolheu bem mostrando com detalhes o que estavam fazendo em favor dos Warau e Panare, aqueles cerca de 40 e estes cerca de 450. Falamos com o cacique Ronny Baez, 29 anos dos Warau e Ramon Paredes um pouco mais velho dos Panare. Quando estes tiveram oportunidade de estar sozinhos reclamaram que não estão bem vivendo nas 4 barracas, possuem modo de educar as crianças diferente dos Warau. Visitamos também o abrigo onde estão os “criollos”, outro ginásio de esportes e ali o ambiente parecia mais precário. Sem armadores de rede, estes precisam se ajeitar no chão para dormir. Contudo, sentados junto de um grupo de 22 homens que fica na barraca da Defesa Civil, fomos compreendendo que o colapso da Venezuela tem a ver com a vontade do governo de excluir parte de sua população dos recursos advindos do petróleo. Assim sobra mais para o bolso de uma minoria. Um dos motivos básicos para a migração para o Brasil encontrados nos três grupos é a questão da saúde, quando alguém fica doente, eles não tem saúde pública para atender na Venezuela.
Estava trabalhando neste texto na madrugada do dia 9 de novembro e ouvi gritos próprios dos índios que fazem sinal que encontraram caça e estão em sua perseguição. Lembrei-me dos tempos em que eu estava na mata com os Rikbaktsa. Parecia que erem indígenas invadindo a cidade, e fui ver, pois poderia ser um grupo de índios que passava, vindo de algum bar, fazendo algazarra. Mas era o caminhão de lixo que vinha passando pela nossa rua, recolhendo o lixo que produzimos. Assim vi a criatividade própria de cada lugar, pois o grito de guerra próprio dos trabalhadores que acompanham o caminhão de lixo e avisavam o motorista que podia seguir adiante é indígena. Assim como o cobrador de ônibus tem formas próprias de avisar o motorista que pode seguir adiante, assim vamos encontrando formas de estar inseridos neste mundo marcado pelo desemprego e falta de vida digna para grande parte da população. E as elites estão se organizando novamente para permanecer no governo...


O encontro da pastoral indigenista nos preparou para a Assembléia da Diocese de Roraima. A XXIII Assembléia da Diocese de Roraima pensou sua Missão como uma grande casa comunitária, a casa de todos que encontramos na aldeia Pium, aqui chamada também de “malocão”.

A que ponto chegamos: a riqueza humana e ecológica em crise nos propõe uma nova forma de estarmos neste planeta terra, conservando a Amazônia. Em Puerto Maldonado o Papa Francisco vai nos trazer a oportunidade de estar neste discernimento do que fazer para o bem viver com os rios, florestas, animais e seres humanos. Apesar de tão diferentes temos que viver juntos e ir a Roma para o Sínodo ter repercussão mundial. Agora estamos em Pacaraima (RR - Brasil) ao lado de Santa Elena (Venezuela) para compreender a migração nesta fronteira que é totalmente irregular.